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Religião prejudica debate de ideias nas eleições, dizem analistas

POR SÉRGIO RODAS OLIVEIRA
A candidata à presidência da República Marina Silva (PSB) voltou atrás no apoio ao casamento gay e à criminalização da homofobia menos de 24 horas após essas medidas serem anunciadas em seu programa de governo, lançado na sexta-feira (29). O recuo se deveu, supostamente, às críticas do pastor Silas Malafaia, que havia classificado o documento de “vergonha pior que do PT e PSDB”. Cabe lembrar que a ex-senadora é evangélica.

Três dias depois, foi divulgado que o governo Dilma Rousseff, visando evitar a adesão em massa das igrejas pentecostais à campanha de Marina, irá determinar o status de urgência à Lei Geral das Religiões, o que garante prioridade de votação. O projeto, parado há mais de um ano em uma comissão do Senado e prioridade dos evangélicos, estende a todas as entidades religiosas benefícios concedidos pelo Estado à Igreja Católica, tais como imunidade tributária, não incidência de leis trabalhistas para os fiéis que ajudam nos trabalhos das igrejas, de forma a evitar ações, e proteção especial dos bens eclesiásticos contra penhora e desapropriação.

Da mesma forma como ocorreu em 2010, com a questão do aborto, as eleições presidenciais de 2014 caminham para ser pautadas pela religião. E isso é prejudicial para a discussão de ideias, diz o cientista político e professor da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (FGV-SP) Marco Antonio Carvalho Teixeira.

“Eu acho que o debate religioso deveria ficar no campo das crenças individuais, e não no campo da discussão de políticas de Estado. Quando se tem o debate religioso determinando programa de governo, fazendo com que candidatos voltam atrás [em propostas], fazendo com que outros incluam temas, a gente vê que estão atendendo muito mais a cálculos eleitorais do que a visões de sociedade construídas democraticamente”, opina Teixeira.

Para o professor emérito da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Fábio Wanderley Reis, o enfrentamento excessivo entre religiosos e não religiosos pode ser perigoso para a democracia, e acabar criando problemas institucionais. Como exemplo, ele cita os EUA. Lá, o fundamentalismo religioso, em geral apoiado pelos republicanos e por sua vertente mais extrema, o Tea Party, vem dificultando o entendimento com os democratas, tornando a política “claramente disfuncional, às vezes levada à paralisia”, de acordo com Reis.

Lei Geral das Religiões e PT
Os cientistas políticos ouvidos pelo Terra Magazine concordam que seria preferível que as igrejas não tivessem os benefícios estabelecidos na Lei Geral das Religiões, uma vez que o Brasil é um estado laico. “Mas, se for para ter [os benefícios], é necessário ter para todas as religiões, e não só para a Igreja Católica”, diz Reis.

Teixeira vê ainda mais problemas no fato de as igrejas evangélicas obterem benefícios tributários, trabalhistas e relacionados aos seus bens, devido à forma de funcionamento dessas instituições.

“Estamos falando de organizações que lidam com muitos recursos, que, de certa forma funcionam também como organizações empresariais, que, suponho eu, deveriam estar submetidas a regras mais gerais, e não regras específicas”, critica o professor da FGV-SP.

A decisão do governo de acelerar a tramitação da lei, bem como as recentes concessões feitas pelo PT a religiosos, geraram críticas de antigos admiradores do partido. Para eles, a agremiação estaria abandonando os princípios que nortearam sua fundação.

Reis e Teixeira acreditam que as concessões feitas pelo PT não afetaram a laicidade do Estado, nem puseram em risco direitos humanos ou liberdades individuais. Como exemplo da secularidade estatal, Teixeira cita as constantes ações promovidas pelo Ministério Público contra a intolerância de algumas entidades religiosas.

Na opinião deles, as medidas são esforços pragmáticos visando à governabilidade e à vitória nas eleições, algo necessário em uma sociedade altamente religiosa como a brasileira.

Peso dos evangélicos na política
De 2000 a 2010, o número de evangélicos no Brasil aumentou 61,45%, de acordo com o Censo Demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Segundo este último levantamento, eles passaram a ser 42,3 milhões, ou 22,2% dos brasileiros.

O crescimento teve reflexo na política. Hoje, a bancada evangélica tem 77 parlamentares no Congresso Nacional, número superado apenas pelo PT e pelo PMDB. Além disso, a Frente Parlamentar Evangélica da Câmara dos Deputados, fundada em 2003, projeta um aumento de 30% no número de representantes nas eleições deste ano.

O ganho de importância se refletiu, por exemplo, na desistência de o governo federal distribuir cartilhas a estudantes da rede pública que ensinavam a tolerar homossexuais (o “kit-gay”) e na nomeação do pastor Marco Feliciano (PSC-SP) para presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados. E nas recentes ações das presidenciáveis Marina e Dilma, visando agradar os evangélicos.
Apesar do temor do impacto desses fiéis no pleito, o Pastor Everaldo (PSC) tem apenas 1% das intenções de voto, de acordo com pesquisa Ibope divulgada nesta quarta (3). Será que o peso político dos evangélicos está sendo superestimado? Segundo Reis, sim.

“Eu não acho que eles [evangélicos] têm tanta influência a ponto de assegurar a vitória para um candidato simplesmente pelo fato de ele ser evangélico”, afirma o professor emérito da UFMG. Mas ele destaca que “eles são um segmento crescente, já expressivo no eleitorado, e que tende, sim, a marchar de maneira mais coesa do que os católicos, por exemplo”.

Na visão de Teixeira, contrariamente à crença popular, os evangélicos não seguem rigorosamente as orientações de candidatos das igrejas que frequentam. Mas ele aponta que, embora não possam decidir uma eleição para o Executivo, o grupo constituiu uma bancada no Congresso que pode “dificultar ou facilitar a vida de qualquer governo”. Na visão do cientista político, isso justificaria a cautela dos candidatos em não desagradar os evangélicos.
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